“Dix”: quando a autenticidade entra em conflito com a exposição

Uma nova gíria invadiu o vocabulário da Geração Z: “dix”. Para quem ainda não foi apresentado ao termo, ele é usado para se referir aos perfis privados e alternativos no Instagram, criados com o objetivo de compartilhar conteúdos mais íntimos e espontâneos, longe dos holofotes dos perfis “oficiais”. No “dix” vale tudo: desabafos, selfies sem filtro, piadas internas, momentos vulneráveis. É o “off” da vida hiperconectada.
A expressão ganhou as manchetes após uma polêmica envolvendo jovens influenciadores no TikTok. O que parecia uma simples solicitação para seguir o “dix” de um adolescente — Benício Huck, filho de celebridades — virou acusação de flerte e traição entre amigas. E, como manda o figurino da viralização, tudo se transformou em conteúdo, com direito a vídeos, choros e hashtags.
Mas o que essa história revela vai muito além da fofoca teen. Estamos diante de uma geração que cresceu sob os olhos atentos das redes sociais, com timelines cuidadosamente editadas, mas que agora busca resgatar a autenticidade — ainda que em bolhas digitais privadas. O “dix” nasce dessa contradição: a vontade de ser quem se é, mas apenas para quem se escolhe.
No entanto, esse comportamento exige atenção redobrada de pais, educadores e da sociedade como um todo. A criação de perfis privados, embora pareça inofensiva, também traz riscos que não podem ser ignorados:
Pontos de atenção e perigos do uso de “dix”:
- Falsa sensação de segurança: Muitos adolescentes acreditam que, por ser um perfil privado, tudo o que postam está protegido. Porém, capturas de tela, vazamentos e reenvios ainda ocorrem, colocando a privacidade em risco.
- Cyberbullying e exposição emocional: O conteúdo íntimo compartilhado nesses espaços pode ser mal interpretado, alvo de críticas internas ou até usado para alimentar conflitos interpessoais.
- Comportamentos de risco não supervisionados: Sem o conhecimento dos responsáveis, muitos adolescentes utilizam o “dix” para expor comportamentos autodestrutivos, consumo de substâncias, bullying ou relações tóxicas.
- Criação de personas fragmentadas: A necessidade de gerenciar diferentes versões de si — um perfil público e outro “real” — pode gerar conflitos de identidade, ansiedade e pressão para performar autenticidade.
- Vulnerabilidade a aliciamento e golpes: Mesmo em perfis privados, adolescentes podem ser abordados por desconhecidos que se passam por amigos ou seguidores de confiança.
Dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023 mostram que 88% dos jovens entre 9 e 17 anos têm perfil nas redes sociais, e 38% já vivenciaram alguma situação desconfortável ou de risco online. Além disso, estudo da FAESA Centro Universitário mostra que jovens da Geração Z passam, em média, 8 horas por dia conectados às redes sociais — um espaço que muitas vezes substitui o diálogo presencial com família e educadores.
Como especialista em marketing e comportamento digital, acredito que o “dix” é mais do que um modismo: é um termômetro da necessidade de expressão autêntica dos jovens — mas também um alerta sobre os perigos da hiperexposição mal administrada.
Cabe aos adultos não apenas julgar ou reprimir, mas compreender, dialogar e criar estratégias de educação digital que promovam segurança, responsabilidade e bem-estar emocional nesse novo ecossistema online.
Mais do que criticar, precisamos preparar nossos jovens para serem protagonistas conscientes em um mundo onde a linha entre o público e o privado está cada vez mais tênue.
* Este texto não reflete necessariamente a opinião do Caieiras Notícias e é de total responsabilidade do colunista.