Neste sábado (28), Raul Seixas completaria 80 anos se estivesse vivo. Ícone do rock nacional e símbolo da contracultura brasileira, o “Maluco Beleza” deixou um legado musical único e também algumas histórias inusitadas. Uma delas aconteceu em Caieiras e virou um dos episódios mais controversos da carreira do cantor.
O Caieiras Notícias reuniu documentos, reportagens e relatos para relembrar todos os detalhes da noite de maio de 1982, quando Raul Seixas realizou um show na cidade que terminou em confusão, agressões, delegacia e até desconfiança sobre sua identidade.
O que aconteceu?
Segundo relatos da época, Raul Seixas subiu ao palco visivelmente alterado, errando letras e com uma aparência bastante diferente da habitual. Isso teria feito o público que pagou entre 500 e 1.000 cruzeiros pelo ingresso desconfiar que se tratava de um impostor.
A revolta cresceu ao ponto de parte da plateia tentar agredir o cantor no palco, sendo necessária a intervenção da polícia. Mas a situação se agravou ainda mais quando, já na delegacia, o próprio delegado teria duvidado da identidade de Raul.
De acordo com reportagens da época e relatos do próprio cantor, ele precisou cantar músicas de sua autoria e apresentar documentos como RG, passaporte e certidão de nascimento para provar que era realmente o verdadeiro Raul Seixas.
Versões e documentos disponíveis
Documentário “Raul Seixas e a Confusão em Caieiras”
Disponível no YouTube, o mini-documentário apresenta depoimentos de Kika Seixas (ex-esposa de Raul) e Sylvio Passos (fã e biógrafo). Ambos confirmam que Raul estava embriagado no dia do show e que não sabiam que o evento teria conotação política. Kika afirma que um opositor do político responsável pelo evento incitou o público a acreditar que o homem no palco não era Raul.
O documentário também apresenta trechos do programa “Nelson Rubens” da Rádio Record, onde se afirma que Raul teria sido ameaçado de morte caso processasse alguém da cidade. Kika ainda revelou que o cachê de Raul foi pago com um cheque sem fundo.
Programa Gil Gomes
No programa de radio apresentado por Gil Gomes, é mencionado que a expectativa para o show era alta e que Raul receberia 750 mil cruzeiros de cachê. O atraso de quase uma hora para o início da apresentação e o estado físico do cantor teriam contribuído para a frustração do público.
Nota publicada no jornal Estadão
No dia seguinte ao episódio, o Estadão publicou uma nota informando que cerca de 300 pessoas tentaram linchar o cantor no Centro Esportivo Municipal de Caieiras, suspeitando que ele fosse um impostor. A polícia interveio, mas até mesmo na delegacia a identidade de Raul foi questionada. Ele só foi liberado após cantar modinhas e apresentar documentos.
Uma multidão – cerca de 300 pessoas – que assistia ao “show” de Raul Seixas, anteontem à noite, no Centro Esportivo Municipal de Caieiras, tentou linchá-lo, na suposição de que o artista que se exibia no palco não era o cantor, mas algum imitador. Revoltados com a interpretação, os fãs o encurralaram no palco, de onde ele só pode sair mediante forte escolta policial.
E mesmo na Delegacia, Raul Seixas só conseguiu identificar-se, ontem de madrugada, depois de cantar algumas modinhas e mostrar à autoridade a Cédula de identidade, o Passaporte e a Certidão de Nascimento.
O que disseram os jornais de Caieiras
O jornal A Semana, de Caieiras, trouxe informações sobre o show em duas edições:
- Edição 63 (21/05/1982): Relata que o cantor teria apresentado apenas três músicas, segundo o público. O empresário, no entanto, alegava que o show foi completo e que Raul foi agredido ao final. Alguns presentes afirmam que o próprio cantor iniciou as provocações, xingando a plateia.
- Edição 64 (28/05/1982): Raul convocou a imprensa para denunciar que foi vítima de um golpe, com um cheque de 500 mil cruzeiros sem fundo emitido por João de Souza Câmera, como parte do pagamento do show. Seu advogado ainda acusou os organizadores do evento de incitar o público contra o cantor, entre eles Francisco Leílson e o ex-prefeito Gino Dártora.
“Se Raul Seixas soubesse tudo o que lhe aconteceria depois do malfadado show do dia 15 em Caieiras, certamente não teria aceitado o convite de Francisco Leílson – o Léo – para fazer um show em Caieiras na feira do folclore.
Na última quarta-feira, o cantor convocou a imprensa e revelou que, além de ter sido vítima de maus tratos por parte do público e da polícia por ocasião do show, ainda foi vítima de um cheque “frio”, de uma conta já encerrada – em nome de João de Souza Câmera – no valor de 500 mil cruzeiros, que foi dado por ele por Leílson, como parte do pagamento pelo show.
Com esse fato novo, o do cheque, a história tomou proporções bastante diversas daquelas de que se imaginava antes. Para o advogado de Raul Seixas, Arnaldo Ferreira Bastos Filho, a revolta do público no dia 15 e a desconfiança sobre a verdadeira identidade de Raul estão agora esclarecidas. Em sua opinião, o público foi de certa forma incitado por Francisco Leílson, coordenador da Feira do Folclore, junto com o ex-prefeito Gino Dártora.”
📄 Leia as edições completas do jornal A Semana:
Um episódio marcante
Quarenta e dois anos depois, o episódio ainda levanta questionamentos e reflete os altos e baixos de uma das figuras mais geniais da música brasileira. O que aconteceu em Caieiras em 1982 talvez nunca seja completamente esclarecido, mas ajuda a compor o retrato realista de Raul Seixas: talentoso, excêntrico, contraditório — e inesquecível.
“Prefiro ser essa metamorfose ambulante / Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.”
— Raul Seixas











